sobota, 23 października 2010

António Lobo Antunes- Os Cus de Judas

A guerra muda não só as fronteiras, muda também pessoas. As tias da pequena-burguesia lisboeta disseram que a guerra vai «tornar (o narrador) finalmente homem» mas como podemos observar ao longo do livro não e precisamente este homem que tias queriam ver ao voltar da guerra. Narrador recorda o momento da partida com imensa ironia,

«agradecia ao Governo que me possibilitava, grátis, uma tal metamorfose(...) consentindo, num arroubo de fervor patriótico, ser acotovelada por uma multidão agitada e anónima, semelhante à do quadro da guilhotina, que ali vinha assistir a sua própria morte»Os Cus de Judas

A partida para Angola e participação na guerra é vista pelo narrador como absurda, os soldados são comparados com as pessoas que assistem a sua própria morte. A guerra finalmente torna narrador um cobarde, ser estranho que não se encontra na sociedade. Extraído do seu lar e da infância está posto em meio do teatro da guerra onde perde o controle sobre si mesmo. Quem tem poder em situações como esta não e a razão mas o instinto da sobrevivência, a pressão da maioria. Os nobres valore da humanidade deixam de funcionar, ganham força estes dos que temos vergonha, que estão escondidos na nossa subconsciência. Em fragmento referido em cima vê-se também a ironia de governo (Estado Novo em declínio) este é o elemento que aparece muitas vezes ao longo do livro.

4 komentarze:

  1. Pois, as referências ao Estado Novo, ou a Portugal como um estado em geral, também despertaram o meu interesse. Como se vê bem no fragmento por ti citado, os comentários sobre o papel, as acções e decisões do Estado são cheios de ironia e não do respeito e amor pela Pátria. Acho que não podemos chamar nenhum dos soldados de patriota. Tenho uma impressão que eles não guardam nenhum sentimento positivo para a sua terra natal, antes lançam sobre ela a culpa de todo o mal de guerra. Por isso, parece-me oportuníssima a frase de Ricardo Turnes: «os homens que regressaram vivos voltaram a nascer pelo útero de uma puta chamada Pátria» (http://alawebpage.blogspot.com/2007/08/ricardo-turnes-os-cus-de-judas.html). Julgo que, mesmo que seja vulgar, esta expressão exprime perfeitamente a atitude dos soldados perante a majestosa Pátria-mãe que lhes mandou para a guerra.

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  2. Algumas perguntas:
    De que "homem" é que as tias estavam à espera? E porque é que o narrador não consegue cumprir esses requisitos?

    "A guerra torna o narrador num cobarde". Em que sentido? Ele foge da guerra? Ele trai ou abandona os colegas? Apesar de vociferar ou ironizar contra a pátria, continua em Angola (teve hipótese de não voltar quando veio no Natal a Portugal).

    Uma outra pergunta que remete para uma reflexão mais alargada. Estás a relacionar a perda da inocência com a experiência da guerra. Será que a perda da inocência poderá ter começado antes, resultado de uma certa vivência em família? Ou o passado que ele revisita no presente, já não se consegue desligar da experiência da guerra?

    E uma pergunta mais. Haverá alguma nobreza em qualquer guerra ou referir-se-á no narrador apenas a este exemplo de guerra colonial.

    E será a imagem da nobreza e da justiça de uma guerra, algo criado pela Arte (literatura, cinema, etc), pelo poder político ou pelo poder económico?

    Porque, afinal, como citou a Ola, o homem que regressa da guerra tem de aprender a viver de novo, tendo dentro dele tudo aquilo que viveu e que parece que nunca mais poderá apagar de si próprio.

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  3. As tias estavam à espera de um guerreiro estereotipado, ou seja, um homem bravo, valente, nobre, uma ícone de Estado Novo. Mas, como diz narrador «a guerra tornou-nos em bichos, percebe, bichos cruéis e estúpidos ensinados a matar.» Como escreveste no comentário da outra entrada, os heróis são poucos, e em maioria dos casos não se fala do dia-a-dia da guerra. O dia-da-dia da guerra é, como o perfeitamente mostra ALA, obsceno, feio, deformado, sujo. Os grandes valores desaparecem soldado pensa em cumprir as ordens e manter-se, pelo menos, fisicamente vivo. A guerra tem várias facetas, e é ela que mostra a ambiguidade da humanidade o relativismo da nossa perspectiva. As tias esperavam um homem bravo, a guerra colonial era apresentada ela propaganda do Estado Novo como uma luta nobre, mas do ponto de vista dos jovens rapazes, não era tanto assim. Eles tinham de sobreviver em condições muito diferentes das de casa de pequena-burguesia. Como ironiza narrador« nós não éramos cães raivosos antes das cartas censuradas, dos ataques, das emboscadas, das minas, da falta de comida, de tabaco, de refrigerantes, de fósforos, de água, de caixões» Como se pode falar da humanidade quando as necessidades básicas não são saciadas? A degeneração da condição humana começou antes,com os pequenos compromissos e mentiras e a guerra não só despiu um desta máscara mas piorou ainda o seu estado, como diz narrador «desconfiamos tanto da humanidade como de nós mesmos, por conhecermos o egoísmo azedo do nosso carácter oculto sob as enganadoras aparências e um verniz generoso». As pessoas comparadas com cães raivosos, que boa comparação, para mim uma melhor ainda seria com cães raivosos vagabundos, que são agressivos e ao mesmo tempo precisam de carícia, amor. Cães raivosos que eram bonitos, mas agora estão feios, deformados por fome e descuidado, circulam sem destino, como se se esquecessem da sua natureza canina. Os soldados também parecem-me um ''zombie'', vivos por fora mas mortos por dentro, seres que levantam-se quando alguém lhes manda, que cumprem ordens como pequenos robôs, como pequenas partes de uma maquina grande.


    Quanto a nobreza da guerra tudo, como sempre, depende do ponto de vista. Do ponto de vista das massas a guerra quando é apresentada como legítima é boa e nobre e os soldados são heróis nacionais. Eles defendem suas famílias, terra, herança, estilo de vida, liberdade. Mas por outro lado eles em nome destes valores vão fazer coisas mais cruéis e desumanas. Este é o absurdo da guerra. Aqui aparece a pergunta, Será que a guerra pode ser legítima? Na minha opinião a humanidade não fez o seu dever de casa, a guerra não é uma boa solução. Falamos da civilização,mas ao mesmo tempo estamos a usar um mecanismo muito simples e pouco eficaz, que só dá lucros a quem produz armas,porque as despesas, mortes, famílias incompletas existem em ambos os lados do conflito.

    Acho que a cultura guerreira entrou em crise nos anos 60. Este é o tempo de grandes mudanças sociais e culturais. Os movimentos jovens com slogans ''faça amor e não a guerra'' começaram uma voga de questionamento de legitimidade da guerra como tal. Este movimento tem sua continuação na literatura, um bom exemplo é o livro Parágrafo 22 de Heller que de forma mais irónica mostra o absurdo da guerra. Em livro de ALA também encontramos este absurdo e também aparece o absurdo do paragrafo 22. «-uma doença, doutor-insistia o tenente-, anemia, leucemia, reumatismo, cancro, bócio, uma doençacazeca, uma doença de merda que me passe a reserva»

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