niedziela, 19 grudnia 2010

Ana Luisa Amaral

Ana Luísa Amaral é professora de professora de Literatura e Cultura Inglesa e Americana na Faculdade de Letras da Universidade  do Porto. Através da sua obra sabemos que tem uma filha a quem dedica belíssimos poemas.(http://www.mulheres-ps20.ipp.pt/Ana_Luisa_Amaral.htm#Sobre a autora)
Na sua poesia aparecem várias referencias aos autores do cânone literário tanto clássico como moderno. Queria apresentar aqui um diálogo em que a poetisa entra com Fernando Pessoa.

AUTOPSICOGRAFIA
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas da roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama o coração.
F.Pessoa

FINGIMENTOS POÉTICOS

"finge tão completamente"



Faz-me falta a tristeza para o verso:
falta feroz de amante,
ausência provocando dor maior.
Tristeza genuína, original, a
rebentar entranhas e navios
sem mar.
Tristeza redundando em mais
tristeza, desaguando em métrica
de cor.
Recorro-me a jornal, mas é
em vão. A livros russos (largos e sombrios).
Em provocado rio de depressão,
nem zepellin: balão a ervas rente.
Um arrastão sonhando-se navio.
Só se for o que diz o que deveras sente.
A sério: o Zepellin.
Mas coração:
combóio cuja corda se partiu.
A.L.Amaral
Podemos observar como a poetisa ironiza o poema de Pessoa, o eu lírico supostamente mulher tenta fingir para descrever a tristeza, mas é tudo em vão. A poesia que segundo Pessoa deveria entreter a razão não cumpre a sua função porque não se pode fingir, segundo A.L Amaral o sentimento humano. Não importa quantos livros vamos ler, com a leitura nunca conseguíramos viver e sentir a tristeza ou o amor. 


E muito interessante como estes poemas dialogam consigo, não só por causa da alusão e ironia, mas também por causa do genro dos autores. O que acham sobre isso? Acham que as mulheres realmente tem « alegre inconsciência»?

czwartek, 16 grudnia 2010

desfecho breve

O livro não trata explicitamente da guerra. Não é um livro sobre a combate militar em Angola. É sim, um livro sobre a combate existencial. O narrador do livro passou pela guerra, este facto influenciou a sua vida fortemente. O homem que voltou da guerra não é aquele que entrou ao bordo. O médico não sabe como viver. A coesão da sua vida, dos três elementos foi perturbada. O protagonista precisa de começar um novo círculo(bola) que abranja os existentes e permita uma harmonia convivência. Será que é possível desenhar um círculo assim? Para conseguir marcar o ponto 0 do novo círculo é preciso voltar atrás e encontrar um ponto comum. Talvez a narrativa de médico tente marcar este ponto zero. Talvez recontando a sua história ele tenta preencher os espaços entre azul, amarelo e vermelho?

felicidade e OcdJ

«Não, a sério, a felicidade, esse estado difuso resultante da impossível convergência de paralelas de uma digestão sem azia com o egoísmo satisfeito e sem remorsos, (...)qualquer coisa de tão abstracto como a inocência, a justiça, a honra,conceitos grandiloquentes, profundos e afinal vazios que a família, a escola, a catequese e o Estado me haviam solenemente impingido para melhor me domarem»pág.123-124

No trecho em cima podemos observar que os valores tradicionais aceites pela sociedade como imprescindíveis para o ser humano estão vistos pelo narrador como ferramentas de controle. O narrador é muito irónico. Porém como é possível que há 4 páginas ele disse a sua interlocutora

«Não imagina como invejo a segurança tranquila dos vizinhos, a decisão familiar com que abrem a porta(...)»

Acho que baseando-se nestes dois trechos podemos ver como o protagonista tenta descobrir de novo as definições dos conceitos básicos como a felicidade, amor, pátria. A sua posição perante a felicidade muda com a perspectiva que ele toma. Podemos lembrar-nos do esquema proposto por mim. Se o protagonista coloca-se no vermelho o amarelo já não á amarelo, torna-se cor-de-laranja. Acho que a felicidade pode ser alcançada quando o narrador desenhará uma nova bola e preenche-la-a de uma cor que atenue as suas experiências anteriores, que se torne sua cor dominante, aquela que lhe garantirá a segurança e a paz interior. 

esquema da estrutura do romance

O ser humano consiste do corpo, da alma e da psíquica. Estes três elementos devem desenvolver simultaneamente, se não o homem como a conjunção dos elementos antes referidos começa a ter problemas. O desenvolvimento e os procedimentos da personagem estão sujeitas às mesmas regras. Inspirada pelo esquema de Campbell criei as minhas propostas para o esquema do romance e de Os Cus de Judas em particular. Mas antes de apresentar o meu trabalho queria reflectir o esquema de Campbell. Os elementos que aparecem no seu monomito são os seguintes:

apelo à aventura- acho que este ponto pode ser multiplicado no romance o que sugere a estrutura cíclica, como no monomito de Campbell, porém o círculo usado no seu esquema não mostra nenhuma evolução do protagonista.

limiar-é a margem entre o conhecido e o desconhecido, acho que é um elemento muito importante do esquema, ele marca os espaços domados e os que esperam a serem descobertos. Na minha opinião o limiar não deveria ser dentro do círculo, ele deveria marcar espaço onde o protagonista já esteve.

desafios e tentações- este ponto é talvez o mais típico do romance, o protagonista tem as suas aventuras, experiências, que incentivam a sua evolução em três dimensões já por mim referidas.

Abismo-por abismo compreendo uma situação extrema em que o protagonista tem de mostrar o que aprendeu ao longo do período dos desafios e tentações. Pensando no romance OcdJ não há para neste romance o elemento de renascimento, porém o momento de abismo é muito visível. É a saída para Angola que marca fortemente o protagonista, que causa a sua ''morte''

transformação-depois de sobreviver o abismo e de ter a experiência do extremo o protagonista ganha novos traços, desenvolve. Chega o tempo da

reconciliação-o protagonista já sabe quem é e como é, amadurece torna-se completo e íntegro, regressa a sua casa.

Acho que o esquema de Campbell pode ser um ponto de partida muito bom, porém não pode ser aplicado a todos os romances e com certeza não corresponde muito bem com o romance de ALA.

O esquema da diégese pensado por mim, reformula alguns dos conceitos de Campbell, porém tem estrutura 3D. A personagem está composta por três elementos que contribuem para o amadurecimento, o crescimento e finalmente o desenvolvimento do protagonista. O meu esquema em três diemnsões consiste de três eixos de tempo. O primeiro eixo representa o crescimento corporal da personagem, o seu desenvolvimento físico. O segundo representa o progresso moral, ético e religioso. Este eixo está relacionado com a coluna moral e com a alma. O terceiro representa a psíquica.

No meu esquema o ponto zero é o nascimento que por si constitui um apelo, porém este ponto zero pode ser repetido ao longo da vida do protagonista (partida para Angola) e o novo esquema vai coexistir com o primeiro entrando numa relação íntima com ele. A partida involuntária para Angola marcou os pontos 0 nos eixos da alma e da psique. Por isso o narrador do romance é uma personagem tão complicada e difícil de aceitar e compreender pela sociedade. O espaço em branco é o desconhecido enquanto os círculos que constituem o modelo da bola representam o conhecido. O espaço em que o amarelo sobrepõe o azul é o espaço em que a experiência do presente muda o protagonista, deforma-o. Este espaço refere-se também a memória, com novas experiências o protagonista tem outra relação com o seu passado, com aquilo que pensa que é, a distancia entre o ponto 0 muda não só com o tempo, mas também com as experiências.
O círculo ou o seu modelo 3D-bola, são um conceito idealístico, porque na vida real os componentes não desenvolvem com a mesma dinâmica, talvez que o elipse seja uma figura geométrica melhor.

















niedziela, 12 grudnia 2010

Como constrói-se a anamorfose


De acordo com o pedido de Zé vou debruçar-me mais sobre a anamorfose. Abrem por favor o livro na página 59 (Os Cus de Judas 7ª edição de editorial Vega)

O narrador está no bar com a misteriosa mulher, bebem, ele pede que ela o escute e este é o ponto de partida para a anamorfose.

« preciso tanto que me escute, me escute com a mesma atenção ansiosa com que nós ouvíamos os apelos do rádio da coluna debaixo de fogo(...)»

O narrador está no bar, precisa muito que alguém o ouve, seja a mulher, seja a sociedade que ela pode representar, precisa de ter um interlocutor para sentir-se menos só e mais seguro. Este sentimento traz-lhe a lembrança da guerra em que ele tinha de ser muito concentrado, tinha que ouvir as ordens. A anamorfose neste trecho é a anamorfose espaço-temporal, o narrador muda a localidade e o tempo, volta atrás, de agora para ontem e de Lisboa para Angola. No mesmo parágrafo o narrador volta para o bar para depois recordar outra vez em que ele ouvia atentamente, tão atentamente como precisa de ser ouvido agora.
«escute-me tal como eu me debrucei para o hálito do nosso primeiro morto»
Parece que as emoções que o narrador sentia, o modo como ele tinha de reagir transformam se em sua necessidade. Agora é ele que precisa de ser ouvido, é a mulher que tem de se debruçar para ouvir que ele ainda está vivo, que apesar de passar pela guerra continua vivo. 

poniedziałek, 22 listopada 2010

A obscenidade e a sexualidade em Os Cus de Judas

Depois da crise da viravolta moderna os ideais gregos do belo e do bom desactualizara-se. Acho que a modernidade criou a sua definição do belo que não pode ser definida como estético e bonito. A estética pós-moderna concentra-se na descoberta de um método para apresentar a realidade na sua totalidade, a preocupação estética tradicional deixou de ser tão importante. A pósmodernidade usa muito o campo semântico antes conciderado baixo e indigno para a literatura. A nova estética tem alguns traços do turpismo porém o obsceno, feio e grosseiro está apresentado como uma parte integral da vida quotidiana, as pessoas cheiram mal, têm desejos quase animalescos, defecam, masturbam-se. Acho que em Os Cus de Judas o autor tenta chegar a essência do que é um ser humano tambéma través da apresentação deste lado. A nudez, o despir-se de roupas, mas também das máscaras, das regras sociais e do bom tom é o estado em que aproximamo-nos mais a essa essência.

«Pela alminha de quem lá tens entesa-te, supliquei a mirar de viés a minha pila morta, não me deixes ficar mal e entesa-te, pela tua saúde entesa-se, entesa-se, foda-se, entesa-se, a minha mulher mudava fraldas de alfinete de ama na boca, o tenente devia falar na criada ao capelão aterrado que se benzia, os caixões na arrecadação aguardavam que eu me estendesse, obediente, no foro de chumbo, a rapariga parou de me bejar, apoiou-se no cotovelo como as figuras dos túmulos etruscos, passou-me a mão na cara e perguntou O que é que não vai bem, Olhos Azuis?, e eu encolhi os ombros, rodei até ficar de bruços no lençol e desatei a chorar.»

«falta-me a tua vagina ensolarada para ancorar a minha vergonha de ternura, o meu pénis erecto que se curva para ti como os mastros se inclinam na direcção do vento, esta sede de amor raivoso que te escondo»

O ser nú mostra o que escondemos por dentro, mas este lado nem sempre é positivo.

«Era boa, hã? Estava feita com os turas. Comissária, topa? Demos-lhe uma geral para mudar o óleo à rapaziada(...)»

«Está em si, no seu perfil sarcástico desprovido de amor, na obstinação do seu silêncio e no mover mecânico das suas ancas durante o coito, devorando o meu pénis como um estómago digere, indiferente, o alimento que lhe oferecem, recebendo os meus beijos na paciência vagamente aborrecida das prostitutas da minha infância.»

«Entrei no quatro de banho dos sargentos, na pocilga eternamente inundad e nauseabunda a que se chamava quart de banho dos sargentos, vi o oficila abraçado, numa espécie de desespero epiléptico, à prisioneira, criatura muda e tímida encostada aos azulejos,(...)as nádegas do homem formavam um movimento de êmbolo que se apressava, a camisa pegava-se às costas em ilhas imprecisas de suor»

Imagem poética em Os Cus de Judas

A beleza do estilo de ALA está composta por vários factores, linguagem, tamática dos romançes e a sua abordagem. Porém, o que aprecio mais é a capacidade de criar imagens poéticas. ALA é capaz de criar imagens de modo semanticamente económico. Em vez de introduizir descrições longas e pormenorizadas o autor prefere uma linguagem trabalhada, exacta que tenta captar a realidade de forma concreta, concentrando-se no pormenor. As imagens poéticas estão criadas por várias figuras retóricas tais como a metáfora e a metonimia. A economia do estilo de ALA faz com que o leitor não fique aborrecido com a longa descrição, rapidamente capte a imagem adequada. Esta estratégia permita também uma abordegem bem perspectivada do tema, ou seja em 196 páginas encontramos muitíssima informação, detalhes e observações. A riqueza da obra está criada também pela anamorfose, mas deste fenómeno tratarei em outra entrada. Abaixo vão os fragmentos do romance que na minha opinião são uma das provas da perfeição do estilo de ALA.

«Depois do jantar, o motor reticente da electricidade dava corda a uma constelação de candeeiros gagos que aclarava de viés o renque das mangueiras, arrancando ramos trágicos do escuro»

«o amor barato e rápido em compartimentos abafados,aclarados por pavios indecisos de petróleo que coloriam as paredes de barro de uma ilusão de capelas»

«O seu corpo escapa-se me como membros se nos escapam com o sexto drunfo, independentes de nós, flutuando gestos de polvo a que falta o arame dos ossos, e por dentro da sua cabeça giram pensamentos idecifráveis de que me sinto expulso, condenado a permancecer, de pé e à espera, no capacho da entrada dos seus soslaios irónicos, à maneira, sabe como é, de uma lata de conservas de que e não tem a chave»

«São Salvador, La Paz, Buenos Aires, Montevideu, edifícios de andares que as maçãs de Adão dos elevadores percorrem de contínuo para baixo e para cima em deglutiçãoes incessantes vomitando funcionários escuros, de bigodes, cujos sorrisos se abrem como cortinas sobre dentes de oiro de uma amabilidade carnívora»

«De chinelos na coinha, você prepara um café forte como um electrochoque que a projecte para fora do seu invólucro de sono na direcção do emprego»

poniedziałek, 15 listopada 2010

tempo da narrativa e tempo da acção

A magia do romance é o poder cativante da ficção, da ilusão que parece ser mais verdadeira do real. No romance de Antunes atrae-nos a linguagem, a trama, mas também a narração que flui, o fluxo de consciência. Este truque narrativo tem várias características, esta de que eu gosto mais é a relaçáo entre o tempo da narrativa e o tempo de acção. O fluxo da consciência é mais agradável para o leitor, é um truque bastante novo, e preferido pelo escritor moderno, porque exige um trabalho menos detalhado. Os escritores realistas tinham de descrever o espaço da narrativa, tinham de ter cuidado com a cronologia e outros elementos do mundo ficcional. O fluxo da conciência permite uma aproximação mais desleixada, o narrador pode mudar de assunto, fazer uma digressão, pode perder o fio, saltar em tempo, não tem de se restringir a um espaço, o que lhe restringe é o tempo da narrativa, porque o tempo da acção pode abranger sua vida enteira. Como diz Manuel Aguiar e Silva «Ao contrário do tempo objectivo da deigese, o tempo do discurso narrativo é de difícil medição.(...)Poder-se-á fazer coincidir o tempo da narrativa com o tempo que é necessário dispender para a sua leitura? O tempo exigido pela leitura de um texto, porém, é igualmente um critério variável e aleatório» No romance de ALA podemos supor que o tempo da narrativa é um dia,também tendo em conta o critério um bocadinho matemático seria possível ler o livro de ALA em 24 horas. Mas o tempo de diegése é mais amplo, também como o espaço(Portugal, África)

Palavrão com a função literária

Muitas pessoas associam a literatura, a arte em geral com a qualidade do belo. A verdade é que a condição pós-moderna está muito longe dos ideais gregos do belo e bom. Esta viravolta pós-moderna está visivel também no romance antuniano.«No século XX, depois de um longo período pseudomoralista que termina em 1974, os escritores, na sua maioria, passam a utilizar todos
os registos de linguagem disponíveis. António Lobo Antunes tem sido um dos escritores
da actualidade que mais tem utilizado o calão.» (José Barbosa Machado, O léxico obsceno na prosa medieval portuguesa)Em Os Cus de Judas aparecem várias expressões da giria, vários palavrões. Este truque literário pode chocar, mas em vez de ficar ofendido é mehor reflectir qual é a função que esta expressão desempenha na obra. Com certeza não está na obra por acaso, tanto o autor como o protagonista são pessoas formadas, médicos, representantes da pequena burguesia, pessoasa que em maioria dos casos estão preocupadas com a opinião da sociedade, com a sua aparência. Mas como pode um médico usar tantos palavrões? Pode e deve, palavrão é uma das maneiras que nos servem para reduzir a tenção, aliviar as emoções. Na situação do perigo não é difícil encontrar as situações de estresse e a libertação da raiva, frustração ou otras emoções negativas via palavrão é a opção menos perigosa para todos.
Palavrão serve para fortalecer uma opinião ou como um protesto simples contra autoridade, contra ordem, conrta a hipocrisia. Acho que os palavrões no romance de ALA em maioria dos casos desempenham este papel. Junto aos palavrões aarecem cenas oscenas, feias, cruas e nojentas. A guerra não é bonita, como num quadro ou numa descrição.
«caralho, caralho, caralho»
«merda de país de merda»
«caralho de guerra, caralho de guerra»
A obcsenidade das descirções está muito visível porque em maioria dos casos aparece nas descrições do acto sexual, relacionado mais com o campo semántico positivo, bonito, ideal. ALA ao contrário mostra a faceta animalesca, crua e quase fisiológia da aproximação do homem e da mulher. È a querra que torna o homem assim, é a guerra que lhe faz chorar, que lhe diminui a humanidade.
«envergonhado do tamanho do meu pénis murcho que não crescia, reduzido a uma tripa engelhada entre os pêlos ruivos lá em baixo, a hospedeira pegou-lhe educadamente com dois dedos como num jantar de cerimónia não sei se com surpresa ou com desgosto»

O anti-herói heróico- Os Cus de Judas


A reflexão literaria sobre o protagonista, antigamente chamado herói é muito actual no romance de ALA. O imaginário popular cria sempre os heróis da guerra, quanto a guerra colonial a situação complica-se bastante. È dificil dizer quem é herói e se esta exressão pode ser usada nos nossos tempos. A relativização destói os mitos dos guerreiros nobres por um lado mas por outro dá-nos a possibilidade de conhecer os factos. Em Os Cus de Judas não existem heróis, existem só seres humanos tais como são com suas fraquezas, necessidades, emoções e medos, com carne sangue e ossos. No livro de ALA o narrador da história é ao mesmo tempo uma das personagens do romance, mas será que é a guerra é o protagonista, o anti-herói? A discussão à volta dos chamados heróis da literatura está muito interessante porque «o conceito de herói está estreitamente ligado aos códigos culturais, éticos e ideológicos, dominantes numa determinada época histórica e numa determinada sociedade» ( Silva, Manuel de Aguiar e, Teoria e Metodologia Literárias) Qual foi o ideal do herói no tempo da publicação do romance e qual é hoje? Acho que o protagonista no romance de ALA é um anti-heroi por definição o herói «espelha os ideais de uma comunidade ou de uma classe social, encarnando os padrões morais e ideológicos que essa comunidade ou essa classe valorizam». Portagonista do romance, jovem médico da pequena burguesia não representa nenhum dos valores de Estado Novo, é como dizem os autores do livro The politics of war memory and commemoration «heroic antihero» descaradamente criticando o Estado Novo e as beatas salazaristas. Na imagem abaixo podemos ver quais foram estes valores, ou melhor princípios. Nacionalismo, a defesa do colonialismo, patriotismo e culto dos heróis, cristianismo e valorização da família e do trabalho rural. Os trechos do livro, as vezes obscenos, outras vezes sarcásticos não deixam dúvidas que o médico é um anti-herói salazarista po definição.

«As Senhoras Do Movimento Nacional Feminino vinham por vezes deistrair os visions da menopausa distribuindo mdalhas da Senhora da Fátima e porta-chaves comaa efígie de Salazar, acompanhadas de padre-nossos nacionalistas e de ameaças do inferno bíblico de Peniche, onde os agentes da PIDE superavam em eficácia os inocentes diabos de garfo em punho do catecismo. Sempre imaginei que os pêlos dos sus púbis fossem de estola de raposa, e que das vginas lhes escorressem, quando excitadas, gotas de Ma Griffe e baba de caniche, que abandonavam rastros luzidios de caracol na murchidão das coxas.»

«Èramos peixes, somos peixes, fomos sempre peixes, equilibrados entre duas águas na busca de um compromisso impossível entre a incomformidade e a resignação, nascidos sob o signo da Mocidade Portuguesa e do seu patriotismo veemente e estúpido de pacotilha, (…) espiados pelos mil olhos feozes da PIDE, condenados ao consumo dos jornais que a censura reduzia a louvores melancólicos ao relento de sacristia de província do Estado Novo»(Os Cus de Judas)

niedziela, 14 listopada 2010

Os Cus de Judas- Escritor médico ou médico escritor?



Queria voltar para a minha primeira entrada e concentrar-se mais no aspecto semântico do livro e no modo como as duas profissões desempenhadas pelo ALA interferem-se criando o seu estilo. António Lobo Antunes não só refere-se a lilnguagem relacionada com medicina, o que é relevante no seu estilo é, como diz Norberto do Vale Loureiro Cardoso «linguagem gongórica». ALA usa metáforas complicadas, acho que todo o livro pode ser compreendido como uma metáfora da guerra, como «uma semantização textual continuada, como uma frase interminável». Esta faceta barroca do romance também é constituida pelas referencias que o narrador faz ao longo do seu discurso. Como um poeta barroco ele usa tantas referencias para explicar melhor o sentido que quer nos transmitir. Junto com a riqueza de linguagem aparece ironia azeda de Antunes o que sublinha a ironia, é sarcastico e bonito ao mesmo tempo.

«(...) casado com uma espécie de botija de gazcidla enfeitada de colares estridentes, sempre a queixar-se aos oficiais dos beliscões com que os soldados lhe homenageavam as nádegas atlânticas, difíceis, aliás, de discernir numa mulher aparentada a um imenso glúteo rolante em que mesmo as bochechas possuíam qualquer coisa de anal e o nariz se aparentava a inchaço incómodo de hemorróida (...)»

«o refelxo do génio, e sobre as nossas cabeças ungidas tombam as línguas de fogo de Johny Espirito Santo Walker
Não acham que o uso de termos médicos, estranhos para quem não estudou medicina, enriquece e tonra ainda mais gongórico o discurso de ALA?

Para mim ALA no primeir lugar é escritor, se não não houvesse na sua obra uma linguagem tão cuidadosamente trabalhada, bonita, complicada e obscena ao mesmo tempo. Mas disso escreverei numa outra entrada.

sobota, 23 października 2010

António Lobo Antunes- Os Cus de Judas

Quando se fala da guerra é muito dificil dizer quem tem culpa ou quem sofreu mais e é mais difícil ainda dizer quem é responsável. Durante minha pesquisa sobre ALA encontrei um blogue muito interessante sobre literatura que de forma muito forte comentou a declaração do autor de Os Cus de Judas

« ''Eu tinha talento para matar e para morrer. No meu batalhão éramos seiscentos militares e tivemos cento e cinquenta baixas. Era uma violência indescritível para meninos de vinte e um, vinte e dois ou vinte e três anos que matavam e depois choravam pela gente que morrera. Eu estava numa zona onde havia muitos combates e para poder mudar para uma região mais calma tinha de acumular pontos. Uma arma apreendida ao inimigo valia uns pontos, um prisioneiro ou um inimigo morto outros tantos pontos. E para podermos mudar, fazíamos de tudo, matar crianças, mulheres, homens. Tudo contava, e como quando estavam mortos valiam mais pontos, então não fazíamos prisioneiros''.
Vós, que fostes combatentes na guerra do ultramar, que achais destas “preciosidades”?
Qual foi o Batalhão presente na guerra do ultramar que teve 25% de baixas? E o que dizer quanto à “guerra dos pontos”? Será que o infeliz Lobo Antunes, no intervalo das suas divagações literárias, se entretêm a jogar jogos de computador e o seu avançado estado de senilidade já não o deixa discernir entre o que é ficção e a o que foi a realidade por ele vivida em Angola nos anos de 1971 a 1973? Esta "guerra dos pontos" não será o reflexo de horas intermináveis a jogar Farm Ville no Facebook?
Na verdade, a “diarreia verbal” do Sr. Lobo, se não fosse trágica (e é...) seria cómica (não, não dá vontade de rir!)
E é grave, vinda de um ex-combatente, tal como nós. Envergonha-nos e envergonha quem profere semelhante verborreia (ou será que ele já não tem qualquer pingo de vergonha?).» 

Extraído do Fórum dos antigos militares do Batalhão de Caçadores 4611/72 (Angola, Novembro de 1972 a Novembro de 1974) http://forum4611.blogspot.com/
A história de ALA não passou despercebida, apareceram vários artigos a volta dela, recomendo o artigo de Manuel Catarino A Mentira e a Carta Aberta da Liga dos Combatentes publicada em Dario de Noticias. Quanto a veracidade das palavras de António Lobo Antunes nunca a vamos saber. Mas sempre podemos supor, ou deixar que nos sugerem.

«A PIDE eu também a conheci e bem. Os comentários aqui expostos, queiram desculpar mas não os posso aceitar ou quanto mais não seja compreender. Estive em angola em 1971 numa localidade de seu nome Chimbila (leste),onde se encontravam os mercenários catangueses que eram comandados por quem?pela PIDE e como é que eles faziam a guerra:? por objectivos:ou seja quantas mais armas mais $$$$ e isso significava o que? quem fica sem arma .... Sofri nessa localidade ao ver o que esses esbirros faziam, tanto a mulheres como até a crianças. A guerra psicológica também doí, ou será que estou enganado? »

tirado do blogue http://blog.comunidades.net/africa/index.php

António Lobo Antunes- Os Cus de Judas

« A proximidade da morte torna-nos mais avisados ou, pelo menos, mais prudentes: em Luanda, à espera de seguir dentro de dias para a zona de combate, trocávamos com vantagem a metafisica pelos cabarés safados da ilha, uma pêra de cada lado, o balde de espumante Raposeira » à frente, e a pequena vesga do strip-tease a despir-se no palco no mesmo alheamento cansado com que uma cobra velha muda de pele(…) De facto, e consoante as profecias da família, tornar-me um homem:uma espécie de avidez triste e cínica, feita de desesperança cúpida, de egoísmo, e da pressa de me esconder de mim próprio, tinha substituindo para sempre o frágil prazer da alegria infantil, do riso sem reservas nem subentendidos, embalsamado de pureza, e que me parece escutar, sabe? »

A degeneração humana consoante narrador é a perca do frágil prazer da alegria. Soldados longe das famílias, longe das autoridades e da sociedade sentem-se livres, impunes. Desfrutam desta situação, abusam mulheres, bebem em excesso, tentam suavizar a dor causada pela guerra, tentam tratar a ferida na alma, resultado da desilusão prematura. Os soldados por um lado são jovens, cheios de ideias, ternos, «mesmo antes do sexto JB sem água ou do oitavo drambuie» por outro lado assistindo à brutalidade da guerra tornam-se como animais com fome, que correm para saciar sua necessidade. Acham que durante a guerra as pessoas que não têm controle e autoridades perdem a sua humanidade? Acham que a guerra é  «a aprendizagem da agonia»?

António Lobo Antunes- Os Cus de Judas

A guerra muda não só as fronteiras, muda também pessoas. As tias da pequena-burguesia lisboeta disseram que a guerra vai «tornar (o narrador) finalmente homem» mas como podemos observar ao longo do livro não e precisamente este homem que tias queriam ver ao voltar da guerra. Narrador recorda o momento da partida com imensa ironia,

«agradecia ao Governo que me possibilitava, grátis, uma tal metamorfose(...) consentindo, num arroubo de fervor patriótico, ser acotovelada por uma multidão agitada e anónima, semelhante à do quadro da guilhotina, que ali vinha assistir a sua própria morte»Os Cus de Judas

A partida para Angola e participação na guerra é vista pelo narrador como absurda, os soldados são comparados com as pessoas que assistem a sua própria morte. A guerra finalmente torna narrador um cobarde, ser estranho que não se encontra na sociedade. Extraído do seu lar e da infância está posto em meio do teatro da guerra onde perde o controle sobre si mesmo. Quem tem poder em situações como esta não e a razão mas o instinto da sobrevivência, a pressão da maioria. Os nobres valore da humanidade deixam de funcionar, ganham força estes dos que temos vergonha, que estão escondidos na nossa subconsciência. Em fragmento referido em cima vê-se também a ironia de governo (Estado Novo em declínio) este é o elemento que aparece muitas vezes ao longo do livro.

António Lobo Antunes- Os Cus de Judas

António Lobo Antunes (1942- )




[www.dquixote.pt]


António Lobo Antunes (ALA) autor do livro Os Cus de Judas. Este livro foi editado em 1979 e faz parte da trilogia (Memória de Elefante e, Conhecimento do Inferno ). O titulo refere-se ao sitio que fica muito longe, nos cus de Judas. Este sitio é a Angola dos tempos da guerra colonial. Sitio que fica longe não só do ponto de vista geográfico mas também na dimensão humana. A viagem que o protagonista/narrador do livro faz é a viagem multidimensional, ou seja é a viagem de infância para adolescência, de paz para a guerra, de inocência para os horrores da guerra. Já no primeiro capitulo do livro aparecem recordações da infância. Mas o jardim zoológico, destino comum dos passeios da pequena-burguesia lisboeta, em vez de trazer a memória lembranças felizes traz uma imagem triste. A descrição metafórica do jardim mostra o processo do envelhecimento e da perca da inocência. 
 
«Os plátanos entre as jaulas acinzentavam-se como os nossos cabelos, e afiguravam-se-me que, de certo modo, envelhecíamos juntos(...) uma menopausa vegetal em que os caroços de próstata e os nós dos troncos se aproximavam e confundiam irmanar-nos-ia na mesma melancolia sem ilusões» Os Cus de Judas


Neste pequeno fragmento podemos observar não só a tonalidade triste e melancólica da descrição do jardim, mas também uma das marcas estilísticas do autor. António Lobo Antunes é medico e a sua formação nota-se nas descrições que contêm muitos pormenores anatómicos ou do campo de palavras relacionadas com medicina. O livro trata da guerra em Angola em que autor participou entre 1971 e 1973. O protagonista/narrador do livro tem muitas características do ALA, como diz Célia A. N. Passoni


«Nos romances de carácter autobiográfico, Lobo Antunes parte de um revolver da consciência, procurando entremear passado remoto, passado recente e presente numa investigação cautelosa e minuciosa da memória(...)As experiências vividas constituem-se-lhe fragmentos, estilhaços recolhidos segundo a importância que lhes atribui a memória, daí a falta de linearidade, e o aparente caos em que se transforma sua narrativa. »


A falta da linearidade é relacionada com o estilo da narrativa, as recordações misturam-se com elementos tanto do passado como do presente ou do futuro. Baseando em suas experiências autor constrói uma narração parecida com o fluxo da consistência. Autor usa neste caso a ferramenta psicológica, contando o paciente/narrador tenta «exorcizar seu passado» tenta libertar-se dos seus problemas, neste caso dos horrores da guerra que destroem o ser humano.