O livro não trata explicitamente da guerra. Não é um livro sobre a combate militar em Angola. É sim, um livro sobre a combate existencial. O narrador do livro passou pela guerra, este facto influenciou a sua vida fortemente. O homem que voltou da guerra não é aquele que entrou ao bordo. O médico não sabe como viver. A coesão da sua vida, dos três elementos foi perturbada. O protagonista precisa de começar um novo círculo(bola) que abranja os existentes e permita uma harmonia convivência. Será que é possível desenhar um círculo assim? Para conseguir marcar o ponto 0 do novo círculo é preciso voltar atrás e encontrar um ponto comum. Talvez a narrativa de médico tente marcar este ponto zero. Talvez recontando a sua história ele tenta preencher os espaços entre azul, amarelo e vermelho?
czwartek, 16 grudnia 2010
felicidade e OcdJ
«Não, a sério, a felicidade, esse estado difuso resultante da impossível convergência de paralelas de uma digestão sem azia com o egoísmo satisfeito e sem remorsos, (...)qualquer coisa de tão abstracto como a inocência, a justiça, a honra,conceitos grandiloquentes, profundos e afinal vazios que a família, a escola, a catequese e o Estado me haviam solenemente impingido para melhor me domarem»pág.123-124
No trecho em cima podemos observar que os valores tradicionais aceites pela sociedade como imprescindíveis para o ser humano estão vistos pelo narrador como ferramentas de controle. O narrador é muito irónico. Porém como é possível que há 4 páginas ele disse a sua interlocutora
«Não imagina como invejo a segurança tranquila dos vizinhos, a decisão familiar com que abrem a porta(...)»
Acho que baseando-se nestes dois trechos podemos ver como o protagonista tenta descobrir de novo as definições dos conceitos básicos como a felicidade, amor, pátria. A sua posição perante a felicidade muda com a perspectiva que ele toma. Podemos lembrar-nos do esquema proposto por mim. Se o protagonista coloca-se no vermelho o amarelo já não á amarelo, torna-se cor-de-laranja. Acho que a felicidade pode ser alcançada quando o narrador desenhará uma nova bola e preenche-la-a de uma cor que atenue as suas experiências anteriores, que se torne sua cor dominante, aquela que lhe garantirá a segurança e a paz interior.
esquema da estrutura do romance
O ser humano consiste do corpo, da alma e da psíquica. Estes três elementos devem desenvolver simultaneamente, se não o homem como a conjunção dos elementos antes referidos começa a ter problemas. O desenvolvimento e os procedimentos da personagem estão sujeitas às mesmas regras. Inspirada pelo esquema de Campbell criei as minhas propostas para o esquema do romance e de Os Cus de Judas em particular. Mas antes de apresentar o meu trabalho queria reflectir o esquema de Campbell. Os elementos que aparecem no seu monomito são os seguintes:
apelo à aventura- acho que este ponto pode ser multiplicado no romance o que sugere a estrutura cíclica, como no monomito de Campbell, porém o círculo usado no seu esquema não mostra nenhuma evolução do protagonista.
limiar-é a margem entre o conhecido e o desconhecido, acho que é um elemento muito importante do esquema, ele marca os espaços domados e os que esperam a serem descobertos. Na minha opinião o limiar não deveria ser dentro do círculo, ele deveria marcar espaço onde o protagonista já esteve.
desafios e tentações- este ponto é talvez o mais típico do romance, o protagonista tem as suas aventuras, experiências, que incentivam a sua evolução em três dimensões já por mim referidas.
Abismo-por abismo compreendo uma situação extrema em que o protagonista tem de mostrar o que aprendeu ao longo do período dos desafios e tentações. Pensando no romance OcdJ não há para neste romance o elemento de renascimento, porém o momento de abismo é muito visível. É a saída para Angola que marca fortemente o protagonista, que causa a sua ''morte''
transformação-depois de sobreviver o abismo e de ter a experiência do extremo o protagonista ganha novos traços, desenvolve. Chega o tempo da
reconciliação-o protagonista já sabe quem é e como é, amadurece torna-se completo e íntegro, regressa a sua casa.
Acho que o esquema de Campbell pode ser um ponto de partida muito bom, porém não pode ser aplicado a todos os romances e com certeza não corresponde muito bem com o romance de ALA.
O esquema da diégese pensado por mim, reformula alguns dos conceitos de Campbell, porém tem estrutura 3D. A personagem está composta por três elementos que contribuem para o amadurecimento, o crescimento e finalmente o desenvolvimento do protagonista. O meu esquema em três diemnsões consiste de três eixos de tempo. O primeiro eixo representa o crescimento corporal da personagem, o seu desenvolvimento físico. O segundo representa o progresso moral, ético e religioso. Este eixo está relacionado com a coluna moral e com a alma. O terceiro representa a psíquica.
No meu esquema o ponto zero é o nascimento que por si constitui um apelo, porém este ponto zero pode ser repetido ao longo da vida do protagonista (partida para Angola) e o novo esquema vai coexistir com o primeiro entrando numa relação íntima com ele. A partida involuntária para Angola marcou os pontos 0 nos eixos da alma e da psique. Por isso o narrador do romance é uma personagem tão complicada e difícil de aceitar e compreender pela sociedade. O espaço em branco é o desconhecido enquanto os círculos que constituem o modelo da bola representam o conhecido. O espaço em que o amarelo sobrepõe o azul é o espaço em que a experiência do presente muda o protagonista, deforma-o. Este espaço refere-se também a memória, com novas experiências o protagonista tem outra relação com o seu passado, com aquilo que pensa que é, a distancia entre o ponto 0 muda não só com o tempo, mas também com as experiências.
O círculo ou o seu modelo 3D-bola, são um conceito idealístico, porque na vida real os componentes não desenvolvem com a mesma dinâmica, talvez que o elipse seja uma figura geométrica melhor.
niedziela, 12 grudnia 2010
Como constrói-se a anamorfose
De acordo com o pedido de Zé vou debruçar-me mais sobre a anamorfose. Abrem por favor o livro na página 59 (Os Cus de Judas 7ª edição de editorial Vega)
O narrador está no bar com a misteriosa mulher, bebem, ele pede que ela o escute e este é o ponto de partida para a anamorfose.
« preciso tanto que me escute, me escute com a mesma atenção ansiosa com que nós ouvíamos os apelos do rádio da coluna debaixo de fogo(...)»
O narrador está no bar, precisa muito que alguém o ouve, seja a mulher, seja a sociedade que ela pode representar, precisa de ter um interlocutor para sentir-se menos só e mais seguro. Este sentimento traz-lhe a lembrança da guerra em que ele tinha de ser muito concentrado, tinha que ouvir as ordens. A anamorfose neste trecho é a anamorfose espaço-temporal, o narrador muda a localidade e o tempo, volta atrás, de agora para ontem e de Lisboa para Angola. No mesmo parágrafo o narrador volta para o bar para depois recordar outra vez em que ele ouvia atentamente, tão atentamente como precisa de ser ouvido agora.
«escute-me tal como eu me debrucei para o hálito do nosso primeiro morto»
Parece que as emoções que o narrador sentia, o modo como ele tinha de reagir transformam se em sua necessidade. Agora é ele que precisa de ser ouvido, é a mulher que tem de se debruçar para ouvir que ele ainda está vivo, que apesar de passar pela guerra continua vivo.
poniedziałek, 22 listopada 2010
A obscenidade e a sexualidade em Os Cus de Judas
Depois da crise da viravolta moderna os ideais gregos do belo e do bom desactualizara-se. Acho que a modernidade criou a sua definição do belo que não pode ser definida como estético e bonito. A estética pós-moderna concentra-se na descoberta de um método para apresentar a realidade na sua totalidade, a preocupação estética tradicional deixou de ser tão importante. A pósmodernidade usa muito o campo semântico antes conciderado baixo e indigno para a literatura. A nova estética tem alguns traços do turpismo porém o obsceno, feio e grosseiro está apresentado como uma parte integral da vida quotidiana, as pessoas cheiram mal, têm desejos quase animalescos, defecam, masturbam-se. Acho que em Os Cus de Judas o autor tenta chegar a essência do que é um ser humano tambéma través da apresentação deste lado. A nudez, o despir-se de roupas, mas também das máscaras, das regras sociais e do bom tom é o estado em que aproximamo-nos mais a essa essência.
«Pela alminha de quem lá tens entesa-te, supliquei a mirar de viés a minha pila morta, não me deixes ficar mal e entesa-te, pela tua saúde entesa-se, entesa-se, foda-se, entesa-se, a minha mulher mudava fraldas de alfinete de ama na boca, o tenente devia falar na criada ao capelão aterrado que se benzia, os caixões na arrecadação aguardavam que eu me estendesse, obediente, no foro de chumbo, a rapariga parou de me bejar, apoiou-se no cotovelo como as figuras dos túmulos etruscos, passou-me a mão na cara e perguntou O que é que não vai bem, Olhos Azuis?, e eu encolhi os ombros, rodei até ficar de bruços no lençol e desatei a chorar.»
«falta-me a tua vagina ensolarada para ancorar a minha vergonha de ternura, o meu pénis erecto que se curva para ti como os mastros se inclinam na direcção do vento, esta sede de amor raivoso que te escondo»
O ser nú mostra o que escondemos por dentro, mas este lado nem sempre é positivo.
«Era boa, hã? Estava feita com os turas. Comissária, topa? Demos-lhe uma geral para mudar o óleo à rapaziada(...)»
«Está em si, no seu perfil sarcástico desprovido de amor, na obstinação do seu silêncio e no mover mecânico das suas ancas durante o coito, devorando o meu pénis como um estómago digere, indiferente, o alimento que lhe oferecem, recebendo os meus beijos na paciência vagamente aborrecida das prostitutas da minha infância.»
«Entrei no quatro de banho dos sargentos, na pocilga eternamente inundad e nauseabunda a que se chamava quart de banho dos sargentos, vi o oficila abraçado, numa espécie de desespero epiléptico, à prisioneira, criatura muda e tímida encostada aos azulejos,(...)as nádegas do homem formavam um movimento de êmbolo que se apressava, a camisa pegava-se às costas em ilhas imprecisas de suor»
Imagem poética em Os Cus de Judas
A beleza do estilo de ALA está composta por vários factores, linguagem, tamática dos romançes e a sua abordagem. Porém, o que aprecio mais é a capacidade de criar imagens poéticas. ALA é capaz de criar imagens de modo semanticamente económico. Em vez de introduizir descrições longas e pormenorizadas o autor prefere uma linguagem trabalhada, exacta que tenta captar a realidade de forma concreta, concentrando-se no pormenor. As imagens poéticas estão criadas por várias figuras retóricas tais como a metáfora e a metonimia. A economia do estilo de ALA faz com que o leitor não fique aborrecido com a longa descrição, rapidamente capte a imagem adequada. Esta estratégia permita também uma abordegem bem perspectivada do tema, ou seja em 196 páginas encontramos muitíssima informação, detalhes e observações. A riqueza da obra está criada também pela anamorfose, mas deste fenómeno tratarei em outra entrada. Abaixo vão os fragmentos do romance que na minha opinião são uma das provas da perfeição do estilo de ALA.
«Depois do jantar, o motor reticente da electricidade dava corda a uma constelação de candeeiros gagos que aclarava de viés o renque das mangueiras, arrancando ramos trágicos do escuro»
«o amor barato e rápido em compartimentos abafados,aclarados por pavios indecisos de petróleo que coloriam as paredes de barro de uma ilusão de capelas»
«O seu corpo escapa-se me como membros se nos escapam com o sexto drunfo, independentes de nós, flutuando gestos de polvo a que falta o arame dos ossos, e por dentro da sua cabeça giram pensamentos idecifráveis de que me sinto expulso, condenado a permancecer, de pé e à espera, no capacho da entrada dos seus soslaios irónicos, à maneira, sabe como é, de uma lata de conservas de que e não tem a chave»
«São Salvador, La Paz, Buenos Aires, Montevideu, edifícios de andares que as maçãs de Adão dos elevadores percorrem de contínuo para baixo e para cima em deglutiçãoes incessantes vomitando funcionários escuros, de bigodes, cujos sorrisos se abrem como cortinas sobre dentes de oiro de uma amabilidade carnívora»
«De chinelos na coinha, você prepara um café forte como um electrochoque que a projecte para fora do seu invólucro de sono na direcção do emprego»
poniedziałek, 15 listopada 2010
tempo da narrativa e tempo da acção
A magia do romance é o poder cativante da ficção, da ilusão que parece ser mais verdadeira do real. No romance de Antunes atrae-nos a linguagem, a trama, mas também a narração que flui, o fluxo de consciência. Este truque narrativo tem várias características, esta de que eu gosto mais é a relaçáo entre o tempo da narrativa e o tempo de acção. O fluxo da consciência é mais agradável para o leitor, é um truque bastante novo, e preferido pelo escritor moderno, porque exige um trabalho menos detalhado. Os escritores realistas tinham de descrever o espaço da narrativa, tinham de ter cuidado com a cronologia e outros elementos do mundo ficcional. O fluxo da conciência permite uma aproximação mais desleixada, o narrador pode mudar de assunto, fazer uma digressão, pode perder o fio, saltar em tempo, não tem de se restringir a um espaço, o que lhe restringe é o tempo da narrativa, porque o tempo da acção pode abranger sua vida enteira. Como diz Manuel Aguiar e Silva «Ao contrário do tempo objectivo da deigese, o tempo do discurso narrativo é de difícil medição.(...)Poder-se-á fazer coincidir o tempo da narrativa com o tempo que é necessário dispender para a sua leitura? O tempo exigido pela leitura de um texto, porém, é igualmente um critério variável e aleatório» No romance de ALA podemos supor que o tempo da narrativa é um dia,também tendo em conta o critério um bocadinho matemático seria possível ler o livro de ALA em 24 horas. Mas o tempo de diegése é mais amplo, também como o espaço(Portugal, África)
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